terça-feira, 16 de abril de 2013

[SGM] A Conspiração do Império

Arthur S. Trask

“Finalmente eu digo, deixem os demagogos e salvadores da pátria arrotar seu discurso vazio a ouvidos vazios; ser enganado duas vezes é demais.”

Robinson Jeffers

 
Resenha do livro Day of Deceit: The Truth About FDR and Pearl Harbor, Robert B. Stinnett

 
O falecido Murray Rothbard frequentemente argumentava que longe de ser evidência de um estilo “paranoico” na mente americana, a crença em conspirações como um elemento na história americana nunca foi geralmente levado a sério. A verdade por trás da maioria das teorias de conspiração, ele alegava, era muito mais hedionda e diabólica do que mesmo o mais obstinado teórico conspiracionista suspeitaria. Enquanto muitos achavam que Rothbard estava sendo apenas meio sério, um novo livro sobre o ataque japonês contra Pearl Harbor, de Robert Stinnett, oferece evidência constrangedora de que Murray estava certo. A verdade que emerge enquanto analisamos este volume exaustivamente pesquisado é de uma rede política e militar americana cujo brilhantismo somente é excedido por sua total falta de escrúpulo moral ou patriotismo genuíno. Sessenta anos depois do ataque fatídico, Stinnett descobriu, apresentou e provou a verdade por trás de Pearl Harbor. É claro agora que FDR sabia que o ataque japonês aconteceria. Ele sabia com mais de um ano de antecedência dos planos japoneses de bombardear a frota americana do Pacífico em Pearl, e ele sabia com uma semana de antecedência que o ataque aconteceria no domingo de manhã. Ele sabia porque a inteligência naval americana havia decifrado o código naval japonês no início do outono de 1940, ou seja 15 meses antes do ataque fatídico.

A fumaça mal havia desaparecido de Pearl Harbor quando jornalistas conservadores, poetas mal-humorados e alguns políticos republicanos começaram a suspeitar de que Pearl Harbor foi uma armação. Desde então, historiadores revisionistas têm afirmado que FDR tanto provocou quanto saudou a guerra; e alguns chegaram mesmo a dizer que ele sabia do ataque com antecedência. Historiadores do relato oficial e funcionários do governo rebateram estas críticas insistindo que o ataque foi de fato uma surpresa devido a uma falha da inteligência americana e incompetência no alto comando naval. Stinnett cita o historiador Stephen E. Ambrose que afirmou, tão recentemente quanto um editorial do Wall Street Journal de 1999, que “o problema real era que a inteligência americana era terrível.” De acordo com Ambrose (que repete a história oficial), a Marinha não tinha decifrado os códigos navais japoneses e que a força-tarefa japonesa manteve silêncio radiofônico total em seu caminho para o Havaí. Consequentemente, “no final de novembro, a inteligência ‘perdeu’ a frota de porta-aviões japonesa.” [1] Outros historiadores têm afirmado que os japoneses nos pegaram de surpresa devido a falhas na análise de boa inteligência, excesso de burocracia entre os oficiais de alta patente em Washington, subestimação da ameaça e capacidade japonesas e expectativa de que o ataque aconteceria contra possessões holandesas ou britânicas na Ásia Oriental, não contra o Havaí. Stinnett expõe cada uma dessas teorias como sendo falsas. Por exemplo, ele demonstra exaustivamente que a frota de porta-aviões japonesa realizava transmissões diárias de comunicação via rádio com o alto comando no Japão, comandos militares no Pacífico Central e entre si. Stinnett descobriu a verdade ao ler as interceptações de rádio das transmissões japonesas pela inteligência naval americana. A inteligência americana NÃO perdeu os porta-aviões.

Como Stinnett conseguiu descobrir a verdade quando investigações congressionais (tanto em 1945-46 quanto em 1995) falharam em fazer isso? A resposta está na inteligência, integridade e esforço incansável de Stinnett (algo que consumiu 17 anos), qualidades que sabemos da experiência faltaram nas investigações congressionais. Mas também está em um pedido feito pelo autor em 1983 aproveitando o Ato para a Liberdade de Informação (FOIA, em inglês). Naquele ano, Stinnett soube da existência dos arquivos de inteligência de comunicação da Guerra do Pacífico da Marinha dos Estados Unidos (um arquivo ultra-secreto contendo mais de um milhão de documentos relacionados com a inteligência de comunicação antes e durante a guerra). O pedido do autor foi inicialmente negado, mas em 1994, a Marinha decidiu desclassificar os registros, ou pelo menos uma parte deles. Como Stinnett logo descobriu, interceptações-chaves e documentos permaneceram secretos, alguns estavam faltando dos registros e outros foram adulterados para esconder informação vital. Entretanto, informação suficiente foi liberada, talvez inadvertidamente, de modo a permitir a Stinnett juntar as peças do quebra-cabeças da verdade.

As operações de comunicação de inteligência americana no teatro do Pacífico foi basicamente uma operação naval. A rede de inteligência era composta de 21 estações de interceptação de rádio localizadas ao longo da costa norte-americana do Panamá até o Alasca e nas ilhas do Pacífico do Havaí até as Filipinas. Como Stinnett demonstra, mais de 90% de todas as transmissões de rádio japonesas foram interceptadas por uma ou mais dessas estações. Uma vez interceptadas, estas mensagens eram enviadas para um dos três centros de controle regionais, dois dos quais eram também centros de criptografia, e a partir daí elas eram enviadas para a Estação EUA em Washington, o quartel-general da comunicação de inteligência naval. É claro, todas as comunicações japonesas estavam em código. As mensagens diplomáticas eram enviadas nos códigos Púrpura, Tsu ou Oite; as comunicações navais em um dos 29 códigos chamados Kaigun Ango, o mais importante dos quais eram o 5-Num (operações navais), SM (movimento naval), S (marinha mercante) e o Yobidashi Fugo (sinal de chamada de rádio). Stinnett conclusivamente demonstra que os criptologistas americanos (violadores de código) haviam decifrado todos os quatro códigos navais em outubro de 1940. A inteligência americana decifrou os códigos diplomáticos japoneses mesmo antes: o Tsu nos anos 1920, o Oite em 1939 e o Púrpura em setembro de 1940. Consequentemente, os criptologistas puderam interceptar, decifrar e traduzir quase todo o tráfego de rádio diplomático e japonês em questão de horas após recebê-los. A decodificação e tradução era feita em três centros criptográficos: a Estação CAST em Corregidor nas Filipinas; a Estação HYPO em Oahu; e a Estação EUA em Washington.

A informação de inteligência resultante era então enviada para funcionários de alto escalão das forças armadas e do gabinete, incluindo o presidente (cerca de 36 indivíduos ao todo). Entretanto, como Stinnett meticulosa e amplamente demonstra, a informação crucial que indicava um ataque japonês em Pearl foi deliberadamente retida pelo General Walter Short, comandante do Exército no Havaí, e pelo Almirante Husband E. Kimmell, comandante da frota do Pacífico. Roosevelt e seus conselheiros haviam escolhido estes dois oficiais distintos para serem os bodes expiatórios pela catástrofe em Pearl. A estória de sua traição pelos amigos e colegas no alto comando naval, todos sabendo do ataque iminente e da estratégia de provocação de Roosevelt, é comovente.

Além da interceptação e decodificação das transmissões de radio, a maioria das estações de interceptação de rádio eram equipadas com localizadores de direção via rádio (RDF, sigla em inglês), que permitia a operadores experientes estabelecer o local exato de navios de guerra japoneses uma vez seu sinal de chamada de rádio individual ser identificado. Através do RDF, especialistas de inteligência naval eram capazes de rastrear o movimento da força de porta-aviões japonesa enquanto ela se aproximava de Pearl Harbor. As descobertas de Stinnett confirmam a veracidade da afirmação feita pelo adido naval holandês nos Estados Unidos, o capitão Johan Ranneft, que enquanto visitava o Departamento de Inteligência Naval em Washington em 2 e 6 de dezembro, ele viu mapas de inteligência rastreando o movimento dos porta-aviões japoneses a leste em direção do Havaí. Analogamente, suas descobertas dão apoio ao testemunho de Robert Ogg, que afirma que enquanto em serviço no 12º. Distrito Naval em São Francisco, ele localizou (por meio da inteligência RDF) a frota japonesa ao norte do Havaí três dias antes do ataque.

Talvez o único e mais importante documento descoberto por Stinnett é um memorando de 7 de outubro de 1940 escrito pelo Tenente-Comandante Arthur H. McCollum, chefe da secretaria do Oriente Distante do Departamento de Inteligência Naval. O memorando de McCollum estabelece uma política estratégica criada para induzir os japoneses a cometer “um ato público de guerra” contra os Estados Unidos. McCollum escreve que tal estratégia era necessária porque “não é possível pelo estado atual da opinião política que os Estados Unidos sejam capazes de declarar guerra contra o Japão sem mais barulho.” McCollum sugere oito “ações” específicas que os Estados Unidos deveriam tomar para conseguir este resultado. A principal é a “Ação F” que diz para manter “a força principal” da Frota do Pacífico “nas vizinhanças das Ilhas do Havaí.”  McCollum conclui seu memorando dizendo que “se por estes meios o Japão puder ser levado a cometer um ato público de guerra, melhor ainda.” Stinnett tem pouco trabalho em demonstrar que a estratégia definida neste memorando tornou-se a política oficial da administração Roosevelt. Não somente foi o memorando endossado pelo Capitão Dudley Knox, um dos conselheiros militares mais confiáveis de Roosevelt, mas os registros da Casa Branca mostram que Roosevelt recebeu o memorando; e ao longo do ano seguinte, Roosevelt colocou cada uma das oito ações sugeridas em prática. Ele implementou a última (Ação H) em 26 de julho de 1941, quando ordenou um embargo completo de todos os negócios com o Japão.

O embargo de verão de Roosevelt foi o auge de outra política muito esperta da administração, qual seja ajudar os japoneses a armazenar petróleo para suas reservas militares apenas para encorajá-los a atacar os Estados Unidos, mas não o suficiente para mantê-los em guerra por muito tempo. No verão de 1940, Roosevelt realizou duas ações criadas para implementar seu verdadeiro plano maquiavélico. Primeiro, ele assinou um decreto autorizando a construção de uma grande marinha de dois oceanos. Segunda, ele exigiu das companhias americanas a obter licenciamento governamental antes de vender derivados de petróleo ou metal bruto para o Japão. Pelos próximos 12 meses, a administração prontamente garantiu a exportação de matérias primas de companhias americanas para o Japão, e os navios-tanques e de transporte puderam ser vistos carregando minério de ferro e petróleo nos portos da costa oeste americana. Enquanto isso, a inteligência naval americana, usando o RDF rastreava os navios-tanques para o depósito de petróleo naval japonês em Tokuyama. Os estrategistas de Roosevelt calcularam que ajudar os japoneses a estabelecer uma reserva de dois anos seria o correto. Neste caso, se a guerra estourasse na segunda metade de 1941, os japoneses ficariam sem petróleo em meados ou final de 1943, na época em que a produção industrial de guerra estaria atingindo o seu pico e sua grande frota de porta-aviões (100 unidades planejadas) estaria pronta para ir ao contra-ataque. Em julho de 1941, Roosevelt deu o passo final e, junto com os britânicos e holandeses, impôs um embargo à venda de petróleo, ferro e aço ao Japão (Ação H de McCollum). A armadilha estava então montada, e os japoneses não demoraram para cair nela.

Stinnett não ignora as dimensões morais da estratégia de Roosevelt. Como aqueles que sabiam que o ataque estava para acontecer justificariam o sacrifício de três mil vidas americanas? Um comentário de arrepiar os cabelos feito pelo Tenente-Comandante Joseph J. Rochefort, comandante da Estação HYPO em Pearl Harbor, dá a resposta. Em uma avaliação no pós-guerra do ataque realizado a um historiador naval, ele lembrou que Pearl Harbor “foi um preço muito baixo a pagar pela unificação do país.” Então é isso. Fraude maciça, mentiras, o sacrifício de carreiras militares, a traição de amigos e colegas oficiais, e a morte de milhares de soldados americanos – tudo justificado para incitar um povo pacífico à guerra. O próprio Stinnett está longe de ser contra à estratégia de Roosevelt. Ele concorda com os intervencionistas do pré-guerra que a América precisava ir à guerra contra as potências do Eixo. De acordo com Stinnett, Roosevelt e seus conselheiros “enfrentaram um dilema terrível”. O público em sua maioria se opunha à entrada na guerra e em uma democracia o povo supostamente manda. Mesmo assim, Roosevelt acreditava que esta guerra era necessária e justa. O que fazer? No final, eles decidiram que “algo tinha que ser feito para parar um mal maior.”

Aqui temos outro exemplo de americanos fazendo uso da doutrina que os fins justificam os meios. Os americanos são rápidos em negar a legitimidade ética desta doutrina quando ela é apresentada a eles como uma proposta nua, ainda que não exista nenhuma doutrina que eles se voltam mais rapidamente para justificar práticas moralmente questionáveis. Aqueles que defendem o holocausto nuclear de Hiroshima e Nagasaki argumentam como sua primeira linha de defesa que ele foi moralmente justificado porque salvou vidas americanas? E não podemos esperar para ouvir no futuro próximo daqueles que não podem mais negar a verdade, “A duplicidade de Roosevelt foi justificada porque era necessário parar Hitler.” A resposta cristã a esta questão foi feita por paulo dois mil anos atrás: “E por que não dizer ‘Façamos o mal que o bem virá’? - como somos blasfemados e como alguns dizem que dizemos. Sua condenação é justa.” (Romanos 3:8 Novo Testamento)


Nota:

[1] Ambrose (1936 – 2002) era historiador na Universidade de Nova Orleans e é conhecido por seus relatos patrióticos em Band of Brothers, Soldados Cidadãos, O Dia-D e outros trabalhos. Como biógrafo do ex-presidente Dwight Eisenhower, se opôs veementemente ao envolvimento deste com o extermínio de prisioneiros alemães após a guerra em campos sem quaisquer condições sanitárias. Ambrose, no entanto, “não é flor que se cheire” e esteve envolvido em casos de plágio, falsificação e erros históricos grosseiros.

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