sábado, 28 de junho de 2014

As 10 principais razões para não considerar a Idade das Trevas tão sombria

Jamie Frater

 


Acredito que possamos seguramente dizer que o período da história humana de 476 a 1.000 d.C. é o mais maligno de todos. Este período, conhecido dos historiadores como Idade Média, é ainda conhecido pela maioria dos leigos como Idade das Trevas. De fato, o termo “idade das trevas” é quase tão velho quanto o próprio período – ele foi cunhado em 1330 por Petrarca, o erudito italiano, para se referir ao declínio da literatura latina. Mais tarde, ele foi usado pelos reformistas protestantes (século XVI) e então pelos membros do Iluminismo (século XVIII) como um termo depreciativo com implicações muito maiores, pois eles viam seu próprio “iluminismo” como ausente do período anterior. Dificilmente um julgamento justo do passado. Felizmente, para os modernos estudantes de história, o termo é agora oficialmente conhecido como Alta Idade Média – um nome que não tem nenhuma conotação. Assim, tendo dado a vocês um histórico dos termos empregados, aqui estão dez razões porque a idade das trevas foi, de fato, um período de grande progresso e conhecimento.

10 – As Universidades foram criadas

A Educação Clássica (ainda hoje utilizada em algumas escolas) foi o sistema usado pelas Universidades que foram criadas na Alta Idade Média (as primeiras na história). As universidades ensinavam artes, direito, medicina e teologia (o estudo da religião). A Universidade de Bolonha (fundada em 1088) foi a primeira a conceder títulos. Além da estrutura clássica (baseada na educação grega clássica), estas universidades medievais foram fortemente influenciadas pela educação islâmica que era próspera na época. Enquanto as mulheres não eram admitidas nas universidades no início, a educação feminina existia. Os conventos da época educavam as garotas que frequentemente entravam na escola com pouca idade. Uma delas, chamada Hildegard Von Bingen, é uma das mulheres mais celebradas da era medieval e que teve grande influência no poder.

9 – Estabelecimento das Fundações da Ciência

Enquanto o progresso da ciência era lento durante este período no Ocidente, o progresso era uniforme e de alta qualidade. A fundação foi estabelecida aqui para o maravilhoso florescimento da ciência que ocorreria na Baixa Idade Média. Pode ser dito seguramente que, sem o estudo de ciência da Alta Idade Média, estaríamos consideravelmente atrasados em nosso conhecimento científico hoje.  O professor Ronald Numbers, da Universidade de Cambridge, diz:  “Noções como ‘o surgimento do Cristianismo matou a ciência’, ‘a Igreja Católica medieval criou obstáculos para o crescimento das ciências naturais’, ‘os cristãos medievais achavam que o mundo era plano’ e que ‘a Igreja proibiu autópsias e dissecações durante a Idade Média’ são exemplos de mitos populares ainda vendidos como verdade histórica, mesmo que eles não sejam apoiados por pesquisa histórica.”

8 – Renascimento Carolíngio

O renascimento carolíngio foi o período de avanços na literatura, escrita, artes, arquitetura, jurisprudência, estudos litúrgicos e das Escrituras que ocorreram no final dos séculos oitavo e nono. Os carolíngios eram francos[1] e o mais conhecido deles foi Carlos Magno. O império carolíngio foi considerado um renascimento da cultura do Império Romano. Na época, o latim vulgar estava começando a ser substituído pelos vários dialetos como línguas faladas principais na Europa, de modo que a criação de escolas foi vital para espalhar conhecimento adiante entre o povo. Foi também o período que nos deu a fundação da Música Clássica Ocidental.

7 – Era de Ouro Bizântina

Sob Justiniano, este período nos deu o Corpo de Lei Civil (Corpus Juris Civilis) – um enorme compêndio de Lei Romana.  A alfabetização era alta, a educação elementar era comum (mesmo no interior do país), o ensino básico estava disponível a muitas pessoas e a educação superior (como discutida acima) era também ltamente acessível. No império bizantino durante este período assistimos a uma maciça efusão de livros – enciclopédias, dicionários e antologias. Apesar de não terem criado uma grande nova quantidade de informações, eles solidificaram e protegeram para o futuro muito do que já era conhecido.

6 – Unidade Religiosa

Este é um assunto  controverso, mas o fato é que, durante a Idade Média, a Europa tinha uma única Igreja e concordava com o cânone da Bíblia, e tinha uma tradição filosófica bem desenvolvida. Isto levou (como podemos imaginar) a um grande período de paz dentro das nações ocidentais. Enquanto o Islã não estava de acordo com as doutrinas ocidentais, muito compartilhamento de informações ocorreu e a contribuição islâmica no Ocidente ainda hoje é sentida. Esta união de crenças permitiu um progresso intelectual não visto desde a época do Império Romano em seu auge. De uma certa forma, podemos considerar este período como a calmaria antes da tempestade, já que apenas cem anos depois a Primeira Cruzada haveria de ser convocada para tomar Jerusalém dos mulçumanos – um evento que terminou o compartilhamento de conhecimento entre os dois grupos.

5 – A Chegada da Álgebra

Graças ao aprendizado do povo islâmico no oriente, o mundo recebeu seu primeiro livro de álgebra. O Compêndio sobre Cálculo por Conclusão e Balanceamento foi escrito por Al-Khwarizmi (790-840) e o título árabe do livro nos deu a palavra “álgebra”. Ela vem do nome de Al-Khwarizmi . Este livro nos deu a primeira solução sistemática de equações lineares (de primeiro grau) e quadráticas (de segundo grau). Traduções posteriores de seus livros nos deram o sistema numérico posicional que ainda hoje utilizamos. Al-Khwarizmi, junto com Diofanto de Alexandria, é considerado o Pai da Álgebra.

4 – Arte e Arquitetura

Durante a Alta Idade Média, a arquitetura era eclética e inovadora. Ela introduziu ideia de imagens realistas na arte e preparou o terreno para o período romanesco que viria na Baixa Idade Média. O período também incluiu a introdução e absorção de formas e conceitos clássicos na arquitetura. Pode seguramente ser dito que este período foi o primeiro de alta arte – com estilos prévios (período migratório) sendo muito mais funcional e menos “artístico”. Na Alta Idade Média presenciamos o nascimento de uma incrível e bonita história da arte e engenharia civil.

3 – Clima fantástico

Trivial quanto pareça ser, o clima teve um papel importante nas vidas das pessoas durante a Idade Média e além. Pensamos em “Idade das Trevas” como tempestades de neve, chuvas, trovões e escuridão – tal como vimos em filmes como “O Nome da Rosa”. O fato é que, na Alta Idade Média, a região do Atlântico norte estava aquecendo -  tanto que no início da Baixa Idade Média (1100), a região estava há 100 anos em um evento conhecido como Período de Aquecimento Medieval. Este aquecimento derreteu muito gelo e permitiu aos vikings começar a colonização da Groenlândia e outras nações nórdicas. Ironicamente, da Reforma Protestante (século XVI) até o século XIX, a Europa passou por uma pequena era glacial – o período do Iluminismo era literalmente sombrio e mais frio que a idade das “trevas”. Durante este período, reformas e melhor conhecimento da agricultura forneceram um melhoramento no armazenamento de comida.

2 – A Lei se torna Justa

A Alta Idade Média tinha um sistema complexo de leis que não eram frequentemente relacionadas entre si, mas elas eram eficientes e justas para a maioria. Para os mercadores viajando ao redor do mundo, havia a Lei Mercante (Lex Mercatoria) que evoluiu com o tempo, ao invés de ser criada. Esta lei incluía a arbitragem e promovia as boas práticas entre os negociantes. Simultaneamente, a Lei Anglo-Saxônica foi criada com foco em manter a paz na terra. Enquanto isto eventualmente levou a leis muito duras, viver sob o sistema legal na Alta Idade Média foi provavelmente a melhor época para viver – já que ele era ainda flexível e justo com a maioria. O terceiro sistema legal importante era a Lei Germânica que permitia que cada pessoa fosse julgada pelo seu próprio povo – de modo a não ser uma desvantagem pela ignorância ou diferenças culturais marcantes.

1 – Explosão Agrícola

Se quiséssemos matar um mártir pela fome, a Alta Idade Média não era a época de fazê-lo! Como resultado do clima excelente e grande conhecimento agrícola, o Ocidente estava muito bem na foto. Ferramentas de ferro foram extensamente usadas no império bizantino, o feudalismo em outras partes do mundo introduziu um eficiente gerenciamento da terra e excedentes maciços foram criados de modo que os animais eram alimentados com grãos e não grama. A segurança pública também era garantida sob o sistema feudal e assim a paz e a prosperidade atingiu a maioria das pessoas.  


Nota:

[1] Os francos formavam uma das tribos germânicas que adentraram o espaço do Império Romano a partir da Frísia como federados e estabeleceram um reino duradouro na área que cobre a maior parte da França dos dias de hoje e na região da Francônia na Alemanha, formando a semente histórica de ambos esses países modernos.

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